Poesias

quarta-feira, 29 de abril de 2020

pandemia e alegria estão fora de lugar

2020
março e abril
janelas abertas
portas trancadas
vizinhos escusos
escuras manhãs
de inverno outonal
ideal? Não.
uma pandemia nos assaltou
embora todos se abismem
há os que fogem ás regras do jogo
de vida e morte
sem escolhas
sem demora
o vírus devora a vida
incansavelmente
vimos na China o choro de todas as mães
depois Roma onde um Papa sozinho caminha e ora
praça inundada de silêncio. Sepulcral. O horror!
E mais cidades, cidades,  sitiadas em si.
Guerreiros de luz incansáveis
mãos em luvas e máscaras cortando o rosto
marcando incontaveis horas sem sono,
 debruçados sobre corpos
entre a vida e a morte
Entre a VIDA e a morte
coisa alguma sabemos com certeza
É letal, parece inofensiva idéia
coisa banal
Chega em lugares improváveis
sem pedir licença , retira ali, a voz, o olhar, o corpo
e leva embora sem ar. sem ar.
Deus nas orações, confiamos que se vá tão logo. Tão logo.
as ruas estão vazias, sozinhas, se passos. (...)

em casa, a gente se acostuma, aos poucos. o lugar que comemos e dormimos, mas nunca antes, tão vivenciado. tão microscópico.
e a gente se vê bem de perto..




terça-feira, 5 de fevereiro de 2019

Burroughs 0502


A meta afeta a anima,
a mente mente e altera a alma.
A alma em pedaços, enclausurada..


Abre as janelas e sai.
Não há portas que dê para rua alguma.
Nem repara que há nuvens no lugar do chão.
Pisa em falso, no vácuo. Vacila.
A boca seca, a língua presa ao palato.
Olhos pregados no tapete persa. Sem pressa, pensa.


A cabeça gira, gravitacionalmente.
Tem os olhos acesos, como quem caminha
a frente de si mesmo, do álcool ao chão, quantas vezes sim e não.
Muitas vezes sombras.
Lembra um gato por dentro,
o gato, ele mesmo - Cismado!


O Homem em riste, estupefato, viaja
por lindos sóis delirantes!
Campos de Elísios sabores e trôpegos andarilhos. Beatificados!
Almeja uma última tragada do que sobrou do corpo,
nem digo ossos, que de tão virados, parecem algodão.
Anseia e treme a alma oscilando no corpo - Orbital.


Quantas vezes sim. E, não.


Para Will Lee

Marianne Lee

domingo, 21 de outubro de 2018

Criança-Criatura-Criação

                                              À Mary Shelley


Maria concebeu em densas linhas,
e com lágrimas purgou a dor do parto,
um filho projetado em carne e raios,
a tempestade de sua alma ditou o ato.

Prometeu a si mesma não falhar
em moderna sintonia com o seu Eu.
Tecer o texto e velando, costurar
a carne em brasas de um Moderno Prometeu.

Noites ruíram, insone. Escutem o pranto
derramado em cada página por tão jovem escrita.
A visão em sonhos do seu monstro arrefeceu
os temores e as suas lágrimas nunca vistas.

Do amor ao Poeta que se distanciava,
velas e penas foram lidas- Se exauriu.
A criança-criatura tomou forma,
julgou ser filho do pai que o repeliu.

Duzentos anos se passaram e a criação,
nos permeia a escrita, e assim diria
permanece atual. Em nossos corações,
a dor e o luto na escritura de Maria.

















quinta-feira, 9 de agosto de 2018

In Libro Veritas


O livro que tenho nas mãos,
não é só um livro.
Ele abocanha um pedaço do mundo.
Já foi árvore que balançou ao vento.
Foi folha outonal e quase fruto;
raiz que se enroscou em pedras
e bebeu do sumo da terra.
E, agora ,está aqui, quietinho.
Antes, foi serrado, dobrado, surrado.
Tingido com pequenas letras.
Adornado em negrito, com suaves traços.
Espelho da alma - a tradução.
Aí do nada, você pergunta:
- È Machado, É Marcel?, É Clarice?
- É Barreto, É Drummond, É Foucault?
- É Fiódor, É Bandeira, É Calvino?
- E se for?  - Mas, não é.
- Agora é Rosa!
 O seu e o meu sertão.
Que Prosa!
O libro é um machado,
Machado que nos transporta,
nos transborda, nos transforma.
Atente!
O som do Machado desce,
e acerta o crânio ao meio,
vai deixando as toras partidas,
nas horas lidas.
Este é o fruto colhido,
tardio e maduro. Que sabor!
O libro pronto é um Casmurro, é um Riobaldo!
Abundantes!


Marianne Lee



terça-feira, 30 de setembro de 2014

Tranças ao vento


As garotas brincam inquietas,
mal sabem que tempo é curto
e o relógio brinca de marcar horas.
Deixam os sapatos e correm feitos loucas,
descendo a ribanceira,
o tapete de capim molhado pelo orvalho.
Meninas não demorem,
logo vocês terão trabalho dobrado.

quarta-feira, 24 de setembro de 2014

Agora

E hoje acordei com aquela sensação de que algo me completa, e
que o dia pode perfeitamente ajustar-se ao meu olhar e a minha sina.
Quero estar a par das coisas das quais não sei o gosto e nem o tom.
Qualquer música serve e que seja servida doce, de preferência,  de amargo já basta o tédio.
Pode ser agora!

(...)

Marianne Lee

sábado, 4 de janeiro de 2014

Um sim

Amigos,
acreditem: em nada acredito!
E digo isto do vazio que nos cerca
 e até onde a incerteza alcança.
A cerca que separa a morte e a vida é tênue.
Temos sempre pouco tempo.
 Então, apenas encare o vento e siga!
Sinta!

terça-feira, 10 de dezembro de 2013


 o que sou sem tempo:

mil palavras na cabeça,
 mas sem tempo por enquanto
de juntá-las e criar sentidos.

 O vento é inerte agora.

sexta-feira, 27 de setembro de 2013

ADONIS

Das coisas insones que somos.
Quando sou.

Ainda ontem pensei bem, antes do sono.
Falhas manchas nos meus olhos exaltados e fixos.
Eu penso em suspenso: mesmo que ela falte ou não pretenda e fuja.
Insisto é certo. 
Érato! A musa!
Eu Correrei bravamente. 
Eu não temo o perigo!
Se a casta gente ignorar o meu GRITO,
eu selarei os seus olhos com beijos e mitos.
Eu o miro em meus sonhos, e no espelho marco
que a  Árabe língua não falhe e nem falte,
porque dança nos lábios de quem fala.
Eu jamais volto a minha, se assim sussurrar:
- As-salaam-alaykum!
Escuto do vento que ecoa por lá, e
espero em resposta:
- Alaikum As-Salaam!



Para ADONIS


Marianne Lee.

quinta-feira, 15 de agosto de 2013

Em quem cala

O meu coração está dilacerado.
Nele não cabe os nomes que anseio por.
Os literários, que seja!
Ainda que houvesse branca esperança,
para ele não teria salvação.
É teimoso e gosta de planar.
E imaginem a grotesca cena
enquanto os pombos passam
e as nuvens vão.
Já não conto os tombos...
Que venha homem e são.
Que baste em si, ora!
Quantos suspiros é preciso para impressionar o moço?
Perdi as contas e tropecei na besteira de contar as notas.
A canção ficou assim sem nexo.
E eu que nem tinha algum.
Beijo, boa noite.
Eu vou dormir.
Ele acorda.
Agora!


Marianne Lee



quinta-feira, 6 de junho de 2013

zumm Zum



Passatempo.

 Marca-passo.

  Tempo marca.

   Tempo passa.

    Marca passo.

     Para.

      Tempo

       Tem

        Pó.



Marianne Lee




sexta-feira, 17 de agosto de 2012

Mundogs

para Franz K.


Abram a boca do mundo
e me procurem lá dentro!
Não sei se me escondo,
e se estes escombros me escondem.
Eia! Este mundo é um "utopia",
em tudo falso, pensado.
Riem do louco que despreza tudo
e cria a sua volta a solidão - Abismal,
"Como um cão!"
Mas eu me safei disto.
De agora em diante,
só comerei folhas
verdes e qualquer flor.
A minha língua é inocente!
A minha dor é pura!
Há aqui um homem, uma mulher,
e uma criança em prantos.
E há também os que estão cegos.
Aqui dentro!
Quantos flagelos! Meu D´us!

 DeUs

Este mundo é uma utopia,
em tudo fútil, prensado.
Abram a boca do mundo,
e me encontrem lá dentro
lambendo os dedos sujos
de ócio e de lamentos,
porque eu os tenho, eu tento.
Eu nem queria estar aqui.
Eu nem queria ser - Aqui!
Tenho o meu mundo imaginado;
Sigo o  meu eu, imaginando eu -  Eis!

Há o Poe ma que se pergunta,
que se permite perder,
com perfeita persistência.
Poe, resoluto à imaginação!
Processo.



Marianne Lee




segunda-feira, 2 de abril de 2012

In Vento

 In Vento
                                                                   Para Bertie, um libriano.
 
Das coisas da natureza,
o que mais compreendo é o vento.
O vento me arrasta, me transpassa,
me deixa nua se assim quiser.
E quando bem quer
me enche de areia os olhos.
Choro. Lágrimas pagãs são gastas por nada.
Ai, vento!
É relevante que eu nada invente.
É brisa, é morno, é arrojado.
É vendaval, é ventania.
Fugaz ou lento,
se faz de inocente sopro
e eu pequena me dobro.
Enche de sons os ouvidos e
vira qualquer mar do avesso.
- Quem não temeria?
Tão travesso é o vento.
- Então, não sabem?
Nada a sua vontade escapa:
carvalho, cabelos, folhas,
chapéu coco, chuva, sono.
O vento é livre,
o vento é dono de si
e nele, eu me abandono.


Marianne Lee


segunda-feira, 5 de março de 2012

Café express

Je bois du café
numa rua si belle,
de pedrinhas soltas,
que fogem aos pés, 
se pisá-las,
torto.
Je regarde.
Voilà!
Uma mocinha discreta, e
um rapaz em desleixo 
dividem rindo uma conversa ao meio.
Ele diz coisas que jamais fez
e ela embriagada, suspira:
- S'il vous plaît, Mon Dieu! 
- Il est parfait!
Os olhos dele são doces,
as mãos agitadas e lindas.
Lembram ondas
suavemente vindas
da azul imensidão.
Ah! Se ele fosse seu, 
pensa sorrindo.
E por ser semana,
parece domingo
esse dia cheio
de sol e frescor.
Dizer que é ali amor,
ainda não,
nem mesmo em Paris.
Razão não há para os dois,
apenas são,
o que aqui escrevi.
Seu nome é Gustavo.
Elle est Cécile.


Marianne Lee




segunda-feira, 2 de janeiro de 2012

***

...
Regressar é idéia concebida,
mas morta ao nascer; uma luz que apaga
inconcientemente caso alguém a tenha
em meio aos pesadelos - Olhos fechados.
E vislumbrando a chegada, os abraços e os beijos
do pai, da mãe, da irmâ. As honrarias
por ter deixado milhares estendidos
no dorso fria de uma terra indômita.
...


Marianne Lee

terça-feira, 27 de setembro de 2011

Enigma



Sou o que sobrou da noite
e que não coube ao dia;
parte do refrão da melodia.
Afoite.
O que restou do agora
e faz bem pouco tempo;
o olhar pasmo, atento.
A hora.
O cigarro apagado ao meio,
a taça a borbulhar;
o encher e o esvaziar.
O alheio.
A pedra que ficou na estrada,
a grama fria, tropeçar, cair.
O não voltar ou ter aonde ir.
O nada.
Afoite a hora e alheio ao nada,
o ser proibido que o medo calou.
O que faz ronda pela madrugada
? eu sou

quarta-feira, 31 de agosto de 2011

Falsa sombra

Não me importa se vais embora,
antes de sair feche a porta.
Não importa o café
que não tomou comigo.
Fica melhor sem você, meu amigo.
Não me importa que seja
para longe ou perto...
O deserto, o mar...
Corres, andas, vai- te daqui!
Só quero que me avises
para que eu não precise
fazer a cama e arrumar o seu pijama.
Anda - não se fie em nada,
deixa calada a porta
e a sombra no umbral.
O seu mal é achar que está aqui.
- Se você for ?  Bem eu vou ficar.
Não precisarei fazer o seu jantar.
Leve o seu perfume, leve a sua boca
que me deixa louca só de olhar!
Siga o seu caminho e
esqueça o meu nome.
Falsa sombra!

segunda-feira, 22 de agosto de 2011

Rimbaud

 









O poeta, eu creio.           
                                                                                         
A voz no abismo, sussurra:
um cometa jovem, afoito
sem ventos que o cesse,
vaga pela vaga noite,
cantando em versos - o avesso.

Um comovido mortal
rico em pena, 
intrépido ser.
o amor da musa.
O " Eu é
um outro", 
o que de si,
ousou dizer

E a noite – alta noite,
ele sonha, 
ronda sonhos!
Teme sentir incapaz
de poder 
como os demais
esvaziar-se – 
É medonho!

Em delírio, ele murmura:
Ah! O aroma das canções,
que êxtase absorvê-las!
Que arrepios insones!
De que são feitas as estrelas,
quando as somos?

Marianne Lee

sábado, 23 de julho de 2011

Vox

Quando se tem uma porta que não abre.
Quando se tem um amigo e não se sabe.
Quando se tem um coração que nada cabe.
Quando pensas e ainda assim não ages.
Quando sonhas e me diz: viaje!
Ousa tentar e a vida interage.
 - Que não falte luz e a água não acabe!

Quando é seco o lago ou quando é cheia a margem.
Quando se é deserto e o mundo a miragem.
Mesmo quando rimos do polaco padre.
Se o seu futuro está predestinado
porque teve um filho que não foi gerado
e você se esconde num quartinho escuro
cigarro no meio de lágrimas chovendo.
Temendo o futuro ou arrependendo-se.
- É duro, Amy!

R.I.P

Marianne Lee

sexta-feira, 22 de julho de 2011

Outro cavaleiro

Seo Josino levanta cedo com o sol
pega o seu melhor cavalo - Bâchero.
E vai em busca do matagal, da roça.
Peitando em pau, pedra e cobra surucucu.
Volteia por tudo lá.
Olha o milho, mexe no feijão
que começa a florir,
nas vagens de fava ainda verdes.
Olha o arrozal e perde o olhar
naquele mundão de roça.

O matinho embirra de nascer,
rasteiro e teimoso como só ele.
O Seo Josino pega a enxada,
mais parecendo um cavaleiro medieval
em sua armadura de suor e raça.
E qual uma lança, ele mete a enxada
no peito do inimigo. Eita matinho danado!
O inimigo morre aos pouquinhos, devagar
em meio à multidão que os assiste:
O sol a pino, a passarada, a plantação.

À tardinha, forte e firme,
ele pega o Baio – brinca.
Passa a perna e vai pro rancho
do outro lado do rio.
Deixando atrás de si a poeira,
um belo pôr-do-sol e o roçado.
Vai a galopes o bâchero,
amigo velho de muitas paradas.
Por cima de pau, pedra e cobra surucucu.
O cavaleiro da roça realiza mais um dia
de luta e glória.


Marianne Lee

Vênus

Uma cachorrinha vai passear
com sua velhinha;
vai serelepe,
usa botinhas.
Leva no pescoço
um belo colar
de vivas pedrinhas.
Anda por aqui,
anda acolá
guiando sua dona
pelas ruazinhas.
A cena se repete
em toda tardinha
que faça bom tempo
pois sua velhinha
merece cuidados,
lambidas são dadas
por pura atenção. 
Ouvimos latidos
se um outro cão
também puxa ali,
o dono pela mão.

Marianne Lee

segunda-feira, 11 de julho de 2011

Veloz

Eu gosto de acordar cedo,
pegar minha magrela azul.
Sair com destino certo
dentro do vento,
rumo ao sul.

O caminho é longo.
O sol é forte!
Vamos juntas,
embaladas
pela música
que nos move
na manhã ensolarada.

À tarde quando voltamos,
o sol nos olhos - dourados.
Na ágil magrela azul
o coração encantado,
mas calmo.

O vento forte no rosto
no dia quase acabado;
o cansaço rege o corpo
nos pés meu cavalo alado.

Marianee Lee

sexta-feira, 1 de julho de 2011

Necessária


Falta luz.
Falta água.
Falta comida.
F a l t a!
Falta um ponto e
falta mais.
Falta coragem.
Falta doce.
Faltam laços.
Falta um rim.
Falta o riso.
Falta vir.
Faltam dias.
Faz falta aqui.
Sinto falta.
Falta ver.
F a l t a!
Falta tema.
Falta nexo.
Falta azul.
Falta amor.
Faltam horas.
Falta rima.
F a l t a!
Falta gosto.
Falta língua.
Falta sangue.
Falta pele.
Falta um tanto.
Ah falta!!
Palavra ordinária!
-  E se ela sumisse?
-  Não me faria falta alguma.

Marianne Lee

domingo, 12 de junho de 2011

Versos vazios

                              Á  Bentinho e Capitu

Quando compus estes versos vazios
embebia-me em tédio e rancor;
sem amigos, sem canto, sem hora
de sonhar, de viver, sem calor.

Calor que de ninguém recebo,
e não remeto, pois não tenho a quem;
nem carinhos, nem frases amenas.
Estou ciente que não sou ninguém.

Ninguém só no mundo vive,
tem que alguém lhe dedicar:
poemas e beijos inebriantes.
Sempre ter alguém pra amar!

Amar, querer só alguém...
Estes versos eu compus em memória
de um ser digno a quem eu devote
todo o amor. Existe maior glória?

Existe maior glória que amar
um olhar provocante, fugidio?
Eu pensava em alguém, em você,
quando compus estes versos vazios.

Marianne Lee

sexta-feira, 10 de junho de 2011

Eu ,
    Manuel
              Bandeira ,
                             te
                               amo!

Ma
    ri              e
      a          e
        nn    L
            e 

sexta-feira, 27 de maio de 2011

Cinema mudo

Por uns tempos te amei... paixão, loucura.
Cega fiquei de amor e encantamento.
Perdi completa noção do fictício,
e do real, por uns tempos.

Por uns tempos te quis e a amargura
de tê-lo somente em pensamento;
deixou-me sem rumo em meio à solidão,
e no vazio, por uns tempos.

Por uns tempos chorei a desventura
de não poder te ter ao meu contento.
Te ver partir sem lágrima, sem sorriso,
me fez chorar, por uns tempos.

Por uns tempos sonhei com tal ternura,
todo ardor e o deslumbramento
que possa haver num coração febril,
só por uns tempos.

Marianne Lee

quinta-feira, 26 de maio de 2011

Dom Casmurro de Machado de Assis

" CAPÍTULO 1



  DO TÍTULO

Uma noite destas, vindo da cidade para o Engenho Novo, encontrei num trem da Central um rapaz aqui do bairro, que eu conheço de vista e de chapéu. Cumprimentou-me, sentou-se ao pé de mim, falou da lua e dos ministros, e acabou recitando-me versos.
A viagem era curta, e os versos pode ser que não fossem inteiramente maus. Sucedeu, porém, que, como eu estava cansado, fechei os olhos três ou quatro vezes; tanto bastou para que ele interrompesse a leitura e metesse os versos no bolso.
- Continue, disse eu acordando.
- Já acabei, murmurou ele. - São muito bonitos.
Vi-lhe fazer um gesto para tirá-los outra vez do bolso, mas não passou do gesto; estava amuado. No dia seguinte entrou a dizer de mim nomes feios, e acabou alcunhando-me Dom Casmurro. Os vizinhos, que não gostam dos meus hábitos reclusos e calados, deram curso à alcunha, que afinal pegou.
Nem por isso me zanguei. Contei a anedota aos amigos da cidade, e eles, por graça, chamam-me assim, alguns em bilhetes: "Dom Casmurro, domingo vou jantar com você." - "Vou para Petrópolis, Dom Casmurro; a casa é a mesma da Renania; vê se deixas essa caverna do Engenho Novo, e vai lá passar uns quinze dias comigo." - "Meu caro Dom Casmurro, não cuide que o dispenso do teatro amanhã; venha e dormirá aqui na cidade; dou-lhe camarote, dou-lhe chá, dou-lhe cama; só não lhe dou moça." Não consultes dicionários.
Casmurro não está aqui no sentido que eles lhe dão, mas no que lhe pôs o vulgo de homem calado e metido consigo. Dom veio por ironia, para atribuir-me fumos de fidalgo. Tudo por estar cochilando!
Também não achei melhor título para a minha narração - se não tiver outro daqui até ao fim do livro, vai este mesmo. O meu poeta do trem ficará sabendo que não lhe guardo rancor. E com pequeno esforço, sendo o título seu, poderá cuidar que a obra é sua. Há livros que apenas terão isso dos seus autores; alguns nem tanto."

 Impossível saber quantas, e quantas e quantas outras vezes o leremos.

sábado, 14 de maio de 2011

Metamestre

Gosto pelas letras – O sabor das palavras.
Uma pedra é que começa sua jornada.
Se a pálpebra oscila e o coração arde,
tem pela frente a imensidão da tarde.
Anda pensante, a mão quer a pena;
vai diletante e com um sorriso acena.
Ossos do ofício de uma escrita plena.

Bem, não duvidem do que aqui escrevo,
enquanto conto nos fadados dedos
rascunhos feitos e depois rasgados;
nada concisos, ao mestre ofertados.
Assim cogito, e no entanto lá fora,
risos me dizem que ele passa agora.
Dons não faltam em seu olhar sisudo;
onde é Quixote também é Casmurro.

Gosto pelas letras – O sabor das palavras.
A prosa e a poesia seguem ritmadas,
lugares novos em sua densa escrita;
vultos, silêncios? - Não, tudo ali grita!
Assim sabemos não ser absurdo:
onde é Quixote também é Casmurro.
 
Kafka esculpiu no papel Samsa,
ritmo difuso em obscura dança,
ao mundo deu este disforme humano.
Uns seguem mitos e outros os poetas,  
seguimos Krause e sua ousada meta:
- Então, duvidem de quem seja o plano!

Marianne Lee

quarta-feira, 4 de maio de 2011

Ou

     No amor, há duas faces fatais,
     que o torna, que o faz
     ser irônico sem par:
      Ou é cedo demais pra esquecer,
      ou é tarde demais pra lembrar.

Marianne Lee